Perto das 13:00 começaram a chegar os convidados. A primeira a chegar, cheia de entusiasmo e preparada para não perder uma pitada dos acontecimentos lá estava a Dona Carminda, excessivamente vestida e maquiada para um evento tão pouco formal. Trazia o seu famoso bolo de mármore que, segundo ela, já tinha encantado a mesa de certo sultão.
Não demorou muito para que os 14 se juntassem em torno da mesa de pedra. O espaço, nas traseiras do quintal e adjacente à sala de visitas ficava nesta altura do ano como que coberto por um manto branco de uma buganvília exuberante, a mesa de pedra era rodeada por um pequeno muro que servia também de assento. Algumas pesadas cadeiras de ferro com coloridas almofadas serviam os glúteos mais sensíveis.
A mesa estava devidamente recheada de entradas e petiscos. Todos servidos de bebida foram conversando em alegre cavaqueira antecipando a entrada triunfal da panela do caranguejo.
O espetáculo não se fez rogado, o cortejo vinha da cozinha por um caminho lateral, em frente a pequena Dona Olga de sorriso aberto e acolhedor, seguida do Xavier com a tão esperada panela, e com o Julio carregando a panela do arroz. Faltou à solenidade do cenário um rufar de tambores enquanto as panelas eram depositadas no lugar de honra.
O Sr. Jorge adiantou-se dando o exemplo e serviu-se. Primeiro do arroz, que de seguida foi generosamente regado com molho da panela do caril, com a carne e com alguns corpos e patas de caranguejo ao lado. Um indispensável pedaço de pão para aproveitar o molho. Para o Sr. Jorge o pedaço de pão tinha de ser barrado com bastante manteiga.
Entretanto já tinha sido adicionado à mesa uma tábua de madeira e um pequeno martelo para ajudar a partir a dura casca das tenazes do caranguejo.
As horas seguintes foram de degustação, conversa e muito álcool. Os colegas do ministério não tiveram dificuldade de integrar-se e foram paulatinamente ficando inebriados tal qual o resto dos convidados.
A certa altura o Manuel já incapaz de discernir quem estava em volta: “Arlindo fui lá nas massagens das chinas na Mau-tse-tung. Sabes que no final fui atacado pela moça? Não sei o que pensam aquelas. Ainda mais foi aquela tal Mei Ling que recomendaste. Acho que desaguentou com o meu charme … hehehehe.”
A esta altura o Sr. Arlindo não sabia onde se meter, a expressão da esposa mostrava um tormento de quem tentava conter um ataque de fúria. O marido falava com muito apreço do sitio e não dispensava as duas visitas semanais para se livrar o "stress do trabalho”.
“Parece que está na nossa hora. Vamos Arlindo!”. Disse a ofendida esposa com uma assertividade que fez saltar o pobre Arlindo do assento. O Manuel nem se atreveu a mexer-se e percebeu pelo olhar do chefe que o tema não ficaria por ali.
Com grande sobriedade a Dona Olga agradeceu a visita e acompanhou os convidados a porta. Aproveitou para expressar a sua simpatia pela situação da convidada pressionando firmemente sobre o ombro enquanto se despedia. “Tenha calma que tudo se resolve.”.
Ao voltarem a mesa os restantes convidados rebolavam-se de riso. A Dona Olga sobrepôs ao alarido um sonoro “Quem vai querer sobremesa?” cujo tom matou a galhofa e devolveu a todos o pachorrento ritmo de um domingo a tarde. Todos menos a Dona Carminda que se retorcia num cantinho incapaz de conter a agitação.
Levantou-se quase a correr e despediu-se sem parar “Tenho de ir, preciso fazer uns telefonemas!!!”. Parecia com medo que os detalhes da cena se esfumassem antes de passar a palavra.
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