terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

Zeca o irresistível

Nasci assim meio estranho sem saber que o era. Chamaram-me de Zeca, mas fui marcado de muitos outros nomes que pouco diziam de mim, mais falavam daquilo que os outros achavam do que daquilo que eu era e sentia. Não tenho nome para mim até porque nunca me achei mais diferente do que a diferença que todos temos uns dos outros.

Tinha um dom, ou uma maldição, não sei bem, melhor dizer que tinha uma habilidade, era irresistível. Não se trata de uma vaidade não, até porque não era particularmente bonito, nem sensual, era simplesmente irresistível. Um dom estranho e diria sobrenatural pois bastava cruzar os olhos com alguém “interessante"e zás, estava preso por uma teia invisível e destinado a cortejar e insistir até que eu consuma inteiramente a sua alma e realizasse os desejos que este nem mesmo conhecia.

Diria que os meus olhos eram a própria seta do cupido, e quando disparavam, não importava género, idade, raça, religião, o fim seria sempre o mesmo.

Recordo vivamente a primeira vez que se manifestara o meu super-poder, tinha vindo a Maputo para prestar exames na UEM e me alojara em casa de um tio, irmão mais novo do meu pai. O meu tio era um jovem formado e casado de fresco com Helena uma mulher deslumbrante que meus olhos temiam em fitar. Mas não foi Helena não a primeira vitima.

Certo dia, depois de mais uma longa noite de estudo despertei anormalmente tarde e, como habitual desloquei-me ao banheiro para a minha higiene matinal, não estanhando a porta fechada, que pela hora me achava sozinho, irrompi banheiro a dentro sem noção que este estaria ocupado. Dei de caras, ou antes de corpo com o meu tio completamente nu saindo do chuveiro. 

O corpo escultural e sarado, molhado, a sua pujança escancarada despertou a minha habilidade e quando meus olhos se uniram aos seus o destino de primeira vitima estava marcado.

Quando me apercebi do que se passará fechei imediatamente a porta e fugi para o quarto não ainda consciente daquilo que despertara.

Nem cinco minutos passaram e a primeira vitima bateu de leve à minha porta e com um tom de voz de uma suavidade que nunca ouvira perguntou. - Está tudo bem meu sobrinho?

Fiquei gelado, em pânico, as palavras não me saiam da boca. - "Posso entrar querido?" 

“Querido”, como assim, nunca antes ouvira tal palavra. Apressei-me a trancar a porta e repliquei. - Tio não me sinto bem, acho que estou com febres, vou ficar a descansar mais um pouco.

Nesse primeiro dia a desculpa funcionou. E os dias seguintes passei trancado no quarto tentando deixar o fogo que ateara amainar. Mas a cada dia, do outro lado da porta, os apelos, as suplicas cresciam. De pequenas insinuações transformaram-se em grandes e laudas declarações. Eu fechado em silencio sem saber bem o que fazer.

As suplicas iniciavam assim que Helena saía para o serviço e duravam um tempo indeterminado mas crescente. Por outro lado minha tia se preocupava e reclamava com meu pai que eu estaria deprimido e que passava os dias no quarto, nem para comer saia. Já nem as desculpas de que estudava pareciam tranquiliza-la.

Num infame dia dos heróis moçambicanos tudo de desfechou, incauto abandonei meu cárcere sem saber que era feriado. Minha tia tinha saído, e ao entrar no corredor la estava ele feito um caçador dissimulado na mata aguardando a sua presa. Assim que os olhos se voltaram a cruzar foi como se o mundo em volta sumisse, e uma força magnética incontrolável puxasse os dois corpos para um turbilhão de sensações e de paixões.

A confirmação deste meu super-poder veio pouco depois. Ainda imbuídos no leito em plena paixão e a porta do quarto se abre revelando a figura igualmente deslumbrante de minha tia. Vinha da sua corrida com roupas de lycra que deixavam realçado a sua figura perfeita, de curvas que tinham de ser desenhadas a compasso.

De uma surpresa inicial meus olhos, depois de absorverem a sua figura em luxuria, encontraram seus olhos e viram estes transformarem-se de olhares irados em olhares de desejo quase instantaneamente.

O que se seguiu é indescritível, uma amalgama dos 3 corpos fundidos num ser único e insaciável, liberto de pudores e de tabus em delírio de prazer.

Foi assim a minha introdução ao mundo dos adultos, estabelecendo uma fasquia bem alta. Percebi de seguida o lado negro do meu poder. Consumado o desejo o alvo deste passava do amor profundo à rejeição, como que  envergonhado por se desvendarem desejos que desconhecera.


Nem meia hora passara e estava eu de mochila às costas na rua, proscrito e procurando a próxima vitima.


Um beijo para o vazio ...

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