segunda-feira, 12 de março de 2018

Zeca o irresistível - Parte 2


Encontrava-me despejado e de mochila às costas, atordoado pelos eventos recentes tentava definir o próximo passo. O meu
corpo ainda trémulo da intensidade das ultimas horas, repassava na cabeça os eventos e avaliava a situação: O que dizer aos meus pais? O que os tios iriam contar? Que motivo alegariam para me terem colocado na rua?

A casa que me albergara nas ultimas semanas ficava no sexto andar do PH9, o último do conjunto de prédios conhecidos como PHs situados no final da Avenida Keneth Kaunda. Lembrei-me do Edson Rodrigues, meu amigo de Quelimane que viera para Maputo comigo para, em conjuntoconcorrermos à UEM. Estava em casa do irmão mais velho no bairro de Laulane, com certeza que me dariam abrigo por um ou dois dias.

Atravesso a rua em direção à ATM do Millennium ao lado das bombas de combustível da rotunda da OMM. Eram perto das 12:00 e uma pequena fila se alinhava ao sol em frente à maquina.

Depois de me inteirar sobre o último da fila, perfilo-me aguardando pacientemente a minha vez.

Distraído a pensar com os meus botões sinto repentinamente um volume aproximar-se pelas costas e uma voz doce perguntando quem era o último. Viro-me de dedo em riste pronto para me identificar quando dou de caras com uns seios voluptuosos bem ao nível dos meus olhos. Dos seios meus olhos incautos elevam-se e fixam de seguida os olhos da moça.

Ficamos assim, paralisados uns segundos, enquanto mergulhava inteiro dentro desses olhos castanhos e profundos. Naquele instante ela era toda olhos e mamas e o mundo cessara de existir.

Meu transe foi interrompido estrondosamente por um murro do namorado. Ele estava ali, bem do lado dela, enfurecido com o desaforo e com a ameaça à sua honra.

Caí estatelado no chão e mal recuperei do susto vi o buraco onde me tinha metido. Ele era enorme, ainda maior que ela, parecia uma casa e bufava de raiva pronto a desfazer-me em pedaços.

Ela no entretanto escuda-me, atirando-se para cima de mim, ora gritando, ora afagando-me, ora tentando beijar-me, ora espalmando-me. Sufoco-me sem me conseguir libertar  até que o namorado a arrasta para o lado, abrindo espaço para desferir o segundo golpe.

Consigo rebolar a tempo de sentir o movimento do seu punho rasar a minha cara e embater com estrondo no chão. Lesto, recomponho-me e desato a correr a Keneth Kaunda abaixo. 

Imediatamente percebo que os dois personagens correm em perseguição, ela enfeitiçada e ele enraivecido. 

Consigo manter a minha corrida intensa e sem parar até à esquina da faculdade de direito, cerca de um quilometro. Nessa esquina, já a deitar osbofes pela boca, contorno a curva e sento-me no chão encostado ao muro da casa de esquina. Depois de respirar fundo algumas vezes, espreito para o caminho de onde vinha e vejo os dois vultos, ao longe, mas caminhando determinados em minha direção. Mesmo ao longe consigo sentir a intensidade do seu olhar.

Avalio a minha situação. Ou continuo pela Keneth Kaunda ou sigo por esta rua até à Avenida do Zimbábwe. Nisto olho em direção da Avenida do Zimbábwe e deparo-me com três silhuetas, três mulheres da noite que estendiam seu turno na esperança de aproveitar o feriado. 

Noto primeiro as meias rendadas e as saias curtasdepois os tops de leatherShitmais uma vez não consegui parar a tempo e mal cruzo olhares. De imediato o trio começava a deslocar-se em minha direção, com olhos esgazeados, predadores cheios de intenções.

Não me resta hipótese senão continuar em fuga pela Keneth Kaunda abaixo. Enquanto corria, o meu quinteto de perseguidores junta-se num pelotão ruidoso, caricato, determinado em meu encalço pela rua e sem mostrar sinais de cansaço.

Quase a chegar à esquina da Kim Il Sung vejo um chapa parado e grito para que espere. É a minha salvação. O carro, que já arrancava, se imobiliza logo de seguida e abre a porta dos passageiros. Ofegante salto para dentro e incentivo com urgência o condutor. - Vai, vai, arranca, vamos!

O cobrador fecha a porta e o chapa arranca com um chiar de pneus. Sinto-me aliviado, vejo no retrovisor os perseguidores a esbracejarem a perderem-se na distância. Baixo a cabeça e largo um suspiro de alívio. Nisto o cobrador afirma que são 12 Meticais. Recordo-me que não cheguei a levantar o dinheiro. Levanto a cabeça e olho o cobrador. Um jovem com uns olhos claros e meigos … oh não …

Um beijo para o vazio …

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